domingo, 31 de março de 2019

DIVÃ

     Me sinto apagando. Ou estou com medo de apagar, não sei. Como cuidar de uma chama em meio a um vendaval; mas tudo ao meu redor parece estático. A tristeza é uma das coisas que mais me faz sentir viva, pois parece que me relembra de minha potência de ser afetada ao extremo, por todas as facetas da realidade. A alegria, por outro lado, queima minha face e minhas mãos. A felicidade não: é morna. É esse fogo presente em mim distribuído por todo meu corpo. Me derrete. Ultimamente, todo o calor está concentrado no fundo do meu peito, não consegue aquecer nem o coração.
     Não sei se algo do que escrevi é verdade, mas me faz sentido. Não me compreendo nos últimos tempos e não sei por onde começar a me explicar. Se for começar pelas coisas concretas, devo dizer que estou sentada em uma praça, usando um tênis vermelho igual a cor dessa caneta e hoje fazem 54 anos do Golpe Militar. Hoje assisti um filme sobre amores eternos e sobre essa época da vida em que paramos de achar que coisas vão acontecer. A tal da meia-idade, quando já conseguimos ver o fim.
     Faz tempo que parece que nada acontece.
     Segundo Freud, estou de luto, mas é por algo que não deixo morrer. Algo que já não me faz mais sentido, o que só deixa tudo mais desesperador. O que morre são minhas esperanças falhas e eu sinceramente não sei mais o que gosto na vida; o que amo. Acho que quero ser amada mas, mais importante que isso, quero amar, e quero amar o amor que sentem por mim. Tive isso por um tempo e termino carregando um amor que não posso entregar a ninguém e que não me pertence. Termino segurando um futuro que não aconteceu e que não aconteceria. Quero um futuro que não aconteceria, não acontecerá e sei disso. Não sei o que fazer: sem isso, morro como uma planta afogada em seu próprio vaso.
     Mas talvez as coisas mais belas são as que morrem antes do fim - ou talvez essa seja eu tentando achar algum sentido em tudo isso. Não me deixo sofrer escancarada pois me parece ridículo sofrer por algo que não aconteceu. Mas não são essas as coisas que mais doem: as que não foram, as que não sabemos? Se considero meus desejos, nem sei mais... Me sinto em um limbo por ser o que quase foi; me sinto tropeçando no que quis ser. Não consigo terminar isso - o relato, os pensamentos, o passado, os desejos. Não consigo me divorciar das coisas que quero e não posso; de tudo o que quero e não consigo explicar, não consigo colocar no mundo.
     Me vejo bonita no espelho, mas não me sinto assim. Me sinto em falta: que me falta algo, um eu. Não consigo ser autossuficiente, pois isso parece algo escandaloso de se pedir a si mesmo. Procuro por alternativas. Seria isso uma alternativa? Mas suficiência não me parece ser o viver! Mas, e se essa vida que procuro não for possível de ser? O que me resta? Queria que alguém entendesse o que digo, para me responder, pois já estou farta de minhas próprias perguntas.

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