domingo, 14 de abril de 2019

O FILHO DE MIM, HOMENS

Conta-me o passado como se fosse algo irreparável
me entregando um furacão de coisas regurgitadas
que deixei para trás e aqui dentro:
- Essa é você.
Fui sua heroína
até essa palavra se tornar uma droga
- não queria ter feito nada do que não fiz.
Mas foi você quem quebrou tudo
apenas sentando para ver televisão
e me olhou como se seus olhos fossem saltar
e fazer uma ciranda,

mas tudo está sempre tão fixo em ti
parece que a Terra terá que desabar
para perceber que seus ossos
são mais frágeis que um orgulho;
que seu coração não digere esses silêncios.

Lembra-se de puxar meu ouvido até o bigode?
Foi só para me lembrar
que seus dedos esquerdos
eram mais fortes que meus direitos.
Lembra-se dos gritos em cima de choros?
Era só para me lembrar
que não havia o que ser feito -
esse mundo não é para nenhum de nós.
Você pergunta por vestidos bonitos
em noites de cristal e lustres de óperas
mas eles foram só para te lembrar
que eu não sou um homem;
eu nunca vou ser.

Se um dia ficarmos sozinhos e inversos
perceberemos que nossa companhia agrada.
Mas, depois das batidas, me esperava no batente;
depois dos palavrões, caia pelo parapeito
e ainda é o seu peito que engole cada palavra do que falo.
Eu não consigo me comunicar com quem não sente
- ou quem esquece de sentir -
mas repito em respeito, receosa
de que nem em seu enterro haverá um silêncio tão mortal.
De nada adianta:
eu não consigo me acostumar com quem vai embora.

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