Sentei-me ofegante
depois de rir quando ela me perguntou:
"Tudo bem?",
pois
vi a ironia de pagar quinhentos reais por mês para alguém se interessar sobre
como anda o meu interior. Para a sorte dela, o meu estava em ruínas, então seus
quinhentos reais continuavam vindo rabiscados em um cheque todo mês.
Já
comecei falando antes dela suspirar, como sempre fazia:
"Ontem a noite foi escura e não
consegui enxergar o que estava sentindo". O cenho se franziu; o interesse
preencheu os olhos. "Não haviam estrelas, mesmo eu procurando arduamente
pela janela. Me perguntei o que se fazia no lugar onde a vista não
alcançava mais naquela hora. Cheguei na conclusão que não havia quase nenhuma
probabilidade de estarem fazendo o mesmo que eu".
O
silêncio seguiu e eu sabia que seguiria até que eu o quebrasse ou até que eu me
perdesse a tal ponto nos meus próprios pensamentos que ela tivesse que me
resgatar.
"Também pensei sobre esse lodo cinza que me preenche: cheguei na
conclusão que não é cimento. Eu ando achando que a tristeza é só muito tempo
sem ter o que fazer. Quem é pobre não tem tempo de ficar deitado chorando, como
eu faço de tarde".
Olhei para os passarinhos que passavam
do lado de fora da janela. Invejei-os, pois, se quisessem, fumariam um cigarro
e também por não terem criado leis ou lugares fechados, onde acabariam por
proibir o tabaco de queimar.
Afinal, continuávamos numa selva e
eu era uma andorinha fugindo de leões. "Como ganhar desses leões?"
ela já havia me perguntado. Eu respondi que não se ganhava
sendo andorinha: se
era devorado.
Eu não
entendia nada de biologia então mudei o rumo para o que eu queria entender:
tudo.
Me
perdi na imensidão da opacidade que recheava qualquer coisa viva que permeava a
minha existência.
Eu não
entendia porque o ser humano era mau ou porque o dinheiro existia. Porque meus
amigos usavam drogas ou porque eu fumava um cigarro toda a saída da escola.
Porque a escola não entendia quando alguns diziam que não dava mais ou porque
eu tinha que entender tudo, se sabiam que todos ali eram incapazes de tal
feito. Eu não entendia direito a divisão de legislativo, executivo e judiciário
ou porque o ser humano se complicou tanto se depois não teve a audácia de
assumir seus próprios erros.
Eu percebi que estava em silêncio
quando me assustei ao ouvir: "No que está pensando?". Tentei resumir
tudo em uma frase: "Que nasci na hora errada. Ou no lugar errado".
Esperei que ela dissesse que a sessão havia terminado, mas ela ainda tinha o cenho franzido. Suspirei.
Acho
que me sinto sozinha.
Sai de
lá com o fracasso preso na garganta.